As empresas bem sucedidas em geral, adoram números. E nas últimas décadas observamos as universidades de referência na área de negócios se destacarem com a ênfase nos números.
Mas, como isso poderá influenciar a nossa formação e a qualidade das informações que embasam nossas decisões?
Sabemos que nenhum plano estratégico finaliza sem uma planilha detalhada com ações traduzidas em indicadores de desempenho. A habilidade de montar essas planilhas é um dos motivos pelos quais muitos jovens buscam escolas como Stanford e Harvard. Destas instituições saem gestores com habilidades quantitativas aguçadíssimas — habilidades que vão logo para prática.
De fato, a administração por números ainda reina imponente, principalmente com os avanços da TI (tecnologia da informação) e os mais sofisticados modelos econométricos que ampliaram o entendimento de que o sucesso das empresas poderia ser determinado pela capacidade de processamento de dados que possui e da capacidade de modelá-los.
Contudo, é justamente sobre essa “via de mão única” que trago hoje o meu ponto de vista.
Sobre essa ênfase nos números (no financeiro), um grande avanço foram os estudos desenvolvidos no final da década de 1980, por Robert Kaplan (professor da Harvard Business School) e David Norton (consultor). Eles reforçaram o fato de que os resultados financeiros de qualquer organização são consequência dos resultados não-financeiros (pessoas, processos etc.). O fruto do estudo realizado por eles deu origem ao Balanced Scorecard (BSC), que atualmente, é utilizado por centenas de organizações do setor privado, público e em ONG’s no mundo inteiro e foi escolhido pela renomada revista Harvard Business Review (HBR) como uma das práticas de gestão mais importante e revolucionária dos últimos 75 anos.
O BSC é um modelo de gestão que tem como finalidade a mensuração da estratégia a partir de quatro perspectivas: Aprendizagem e Crescimento, Processos Internos, Clientes e Financeiro. O desdobramentos dos objetivos alinhados nestas perspectivas e a sua relação de causa e efeito permite produzir direcionadores de desempenho não financeiros capazes de criar valor para empresa.
Além da necessidade de mensurar a estratégia, o seu surgimento também foi relacionado com as limitações dos sistemas tradicionais de avaliação de desempenho organizacionais, o que não deixa de ser um dos problemas do planejamento estratégico, uma importante ferramenta para a gestão estratégica.
E o que tudo isso tem a ver com novo cenário de negócios?
CADA VEZ MAIS NOS DAMOS CONTA DE QUE A ESTRATÉGIA É TANTO QUESTÃO DE INTERPRETAÇÃO COMO DE ANÁLISE.
Ao falarmos do novo cenário de negócios “damos conta de que a estratégia é tanto questão de interpretação como de análise” (MARTIN, 2017). Ou seja, além de toda a habilidade de “cientista de dados”, muito bem vinda nesta era digital, é necessária ainda a competência do estrategista, aquele que consegue, não somente ler os dados e séries históricas, mas visualizar possíveis cenários futuros, analisar o intangível, imaginar novas possibilidades e traduzir tudo isso em um plano estratégico, tático e operacional.
Para o Reitor da Rotman School of Management (University of Toronto), Roger L. Martin, muitas empresas já entendem bem essa realidade. Vejamos como exemplo o ex-presidente da P&G, A.G. Lafley, que associa a sua decisão mais certeira na sua carreira a uma interpretação qualitativa. Na década de 1990, quando era gerente-geral de produtos de lavanderia, Lafley precisou decidir se a empresa mudaria para o formato compacto de sabão, que estava transformando o mercado no Japão. O novo formato reduziria custos de produção, embalagem e transporte da P&G e diminuiria o espaço ocupado nas gôndolas e nos depósitos do varejo — tudo isso sem prejuízo para a receita.
Infelizmente, a análise de sondagens do consumidor sugeria que apenas uma pequena parcela do público preferia o novo formato.
Mas Lafley se aprofundou nos detalhes qualitativos, lendo comentários de centenas de consumidores. Descobriu que, embora pouca gente manifestasse o desejo por um sabão compacto, a opinião do resto era neutra — indiferente e não negativa. Ou seja, a aposta na novidade agradaria a uma minoria sem desagradar a maioria — e representaria um grande gol para a P&G. “A análise nunca produz uma resposta”, concluiu. “O máximo que pode fazer é embasar seu juízo.”
É cada vez mais comum a empresa deixar de lado abordagens quantitativas movidas unicamente por estatísticas e buscar subsídios de estudos qualitativos, como a observação do consumidor interagindo com produtos, do cliente customizando e registrando sua experiência, de visita na casa do consumidor ou do momento do consumo, como em bares e restaurantes.
Essas novas abordagens exigem competências totalmente novas.
Os métodos e estudos qualitativos por meio de oficinas, grupos focais e observações estão cada vez mais presentes nos embasamentos das decisões de empresários mais esclarecidos. Triangular métodos quantitativos e qualitativos, passou a ser uma necessidade, por trazer maior precisão para tomada de decisão.
Assim, as empresas poderão conhecer melhor os seus clientes, definir corretamente a sua proposição de valor, alinhar suas atividades, recursos e capacidades para realizar a entrega do valor criado ao cliente e criar a uma cadeia produtiva que gere uma estratégia competitiva sustentável.
Quais são as estratégias e as habilidades necessárias neste novo contexto?
Pois com a habilidade dos números é possível quantificar a oportunidade de geração de receita de um novo produto em uma empresa, mas não há como medir a decepção sentida pelo cliente por um defeito ou falta do produto ou a satisfação sentida por uma experiência de consumo inovadora oferecida para o cliente no momento da compra.
Muito embora não possam ser traduzidos em números, fatores como experiência do consumidor e confiança podem ser interpretados e compreendidos. Aliás, por meio dessa compreensão será possível fazermos distinções importantes entre essa ou aquela estratégia ou prever a resposta emocional de clientes a uma mudança de direção.
No futuro, o líder estrategista de sucesso terá uma noção holística e empática de clientes e será capaz de converter insights um tanto quanto vagos num modelo criativo de negócios que possa ser modelado e revisto em tempo real. Para tanto, precisará ampliar sua visão para perceber mais detalhes, terá de ser um bom líder comunicador, aceitar as possíveis ambiguidades do cenário de negócios e estar pronto para explorar mais informações além daquelas superficiais (MARTIN, 2017).
É isso que acredito que os líderes estrategistas do amanhã devem aprender e que professores terão de ensinar daqui para a frente.
Respostas de 2
Para gestores que se baseiam em uma linha de raciocínio puramente cartesiana, isso será um desafio e tanto(mudança interior). Apesar de eu não ter nenhum estudo para comprovar a afirmação que farei, já presenciei discussões onde, a visão holística é tratada com certo receio/preconceito em detrimento da visão reducionista. O que vejo com muita frequência é uma preocupação em executar a tarefa dada, e durante a execução diversos ‘detalhes’ vão sendo deixados de lado(execução reducionista), e aquelas empresas que se destacam, são justamente as que escolheram olhar para estes ‘detalhes’ ao invés de ignorá-los(visão holística).
Para a física atual é impossível ver um buraco negro, mas podemos ver tudo que ele causa, com isso é possível calcular/estimar diversas informações de forma indireta. Para as empresas, os fatores que você citou, são como os buracos negros, e o grande desafio da T.I. é encontrar meios eficientes de correlacionar ações empíricas com resultados.
Olá Elton, Agradeço a leitura e comentário. Realmente, a diferença está nos detalhes.
Vamos que vamos! Tem muito mais vindo por aí! 😉
Grande abraço!